sexta-feira, julho 28, 2006

A ORDEM EM MIM. A ORDEM EM NÓS.

«Há uma ordem que não tem nome, porque ela é anterior a si e se afunda no incognoscível. Repousar nela. Dormir nela. E achar no seu impensável o impensável de nós, a dissipação de nós que aí se consuma pela vertigem do sem fim e do silêncio...»

Vergílio Ferreira in Conta Corrente

quinta-feira, julho 27, 2006

O peso de um dia perdido...



O vento entra e faz dançar os engomados cortinados cor de marfim, ao mesmo tempo que me toca a pele e me afaga a face e os braços... Transportando o cheiro do verão, quente, doce e seco...

Simultaneamente os meus dedos pressionam as teclas fazendo ecoar um único som seco das peças plásticas que compõem o teclado. O mesmo de sempre... de todos estes anos.

Então... respiro fundo.... despertando-me o ar fresco do início de um novo dia, contudo quente, levando-me a outros dias quentes, de outros quentes anos.

A brisa da noite sempre despertou o meu lado místico, nostálgico especialmente quando banhada de raios de luar brancos e doces que nem açúcar em pó lembrando partículas de gelo.

Paro e viajo por outros dias em que me senti da mesma forma acarinhada, abraçada por esta deslocação de ar suave e tomo consciência que por cada dia que passa, maior é a importância de cada dia.

Além de ganhar altura, pêlos, celulite, e outras acumulações adiposas em partes específicas do corpo, faz parte do "ser adulto" deixar de ter tempo, de poder ter o luxo de desperdiçar um dia que seja, a fazer simplesmente nada de especial.

Prazos, burrocracias (*), responsabilidades, compromissos, tanto a cumprir e tão pouco tempo!

Saudades das quase eternas férias de verão em que me dava ao prazer de estar um dia inteiro em casa a ser somente inútil, preguiçosa, gulosa...

Hoje em dia, nunca o faço premeditadamente, e irrita-me quando por força das circunstâncias tenho uma vivência assim. Vejo-me imediatamente a fazer contas e mais contas para tentar colmatar tamanho e fatal deslize...

Respiro fundo e sinto mais uma lufada de ar fresco a empurrar os cortinados.... agora mais forte...

Engraçado é que tudo isto se trata de relatividade... À medida que o tempo passa, vamos achando que o que lhe antecedeu é que era ideal, e assim sucessivamente.

O meu olhar petrifica e não posso deixar de ter subitamente o pensamento que à medida que crescemos vamos vivendo menos a vida... Eternos insatisfeitos, sôfregos por algo que não sabemos o que é, só sabemos que queremos subir mais um degrau, e mais outro e mais um monte, uma montanha, e uma escada seguida de uma rampa, sem nunca sabermos com certeza se vai dar a algum lado que nos interesse verdadeiramente.

Não seria melhor permanecer no mesmo sítio e deixar que o destino nos encontrasse..? Não estaremos às vezes a fugir dele?

Nunca saberei a resposta. E como não confio na sorte para ditar o meu destino, continuarei a trepar que nem a cabra da montanha, os rochedos escarpados e perigosos da vida.


(*) - não se trata de erro ortográfico

PS: post publicado simultaneamente no blog Baronesa Vermelha - La Femme Fatale


sábado, julho 22, 2006


OS MOTES DOS E NOS MOTES

A propósito do post do meu grande amigo Max e, já que este é um blog dos motes:
1- Eu contra o meu irmão; eu e o meu irmão contra os meus primos; eu, o meu irmão e os meus primos contra os nossos amigos; eu, os meus irmãos, primos e amigos contra os nossos inimigos de aldeia; todos nós e a aldeia contra a outra aldeia… (antigo provérbio Árabe);
2- A riqueza do mundo chega para satisfazer as necessidades de todos, mas não a ganância de alguns. Gandhi;
3- "Si tu te sens petit, inutile ou demoralisé, n`oublie jamais que tu as été, un jour, le plus rapide et le meilleur des spermatozoídes de ta bande...";
4- O amor é o nosso estado natural quando não optamos pela dor, pelo medo ou pela culpa. Willis Harman;
5- Ainda que noutra moldura, estarão os conflitos do Médio Oriente para a III Guerra Mundial, assim como a Guerra Civil Espanhola estiveram para a II Guerra Mundial? O que o Homem faz/inventa no e com o tempo... Que formas mais mórbidas de entretenimento!! Caso para fazer o paralelismo: tal como mais vale estar calado, muitas vezes, mais vale também estar quieto! Será o Big Brother assim tão mau???

sexta-feira, julho 21, 2006

O IMPÉRIO DA VERGONHA
A vida até corria bem para Amatullah Abu Hejleh. Com 22 anos ela, e grande parte das suas melhores amigas, estudavam na Faculdade de Literatura e Ciências Humanas de Beirut, ali mesmo na Boulevard Saeb Salam, pouco antes da Estação de Correios como quem vem da Rua Er Rachidine. Diga-se até que, em abono da verdade, era das melhores alunas finalistas do Curso de Estudos de Literatura Árabe contemporânea, tendo sido convidada para ser assistente na faculdade e iniciar a sua carreira como docente universitária. Não obstante o seu nome (Amatullah, em árabe, significa "servente femininina de Alá), a jovem Hejleh até nem era muito próxima de Deus preferindo, como a melhor literatura lhe ensinara, acreditar nos homens. Sim, tinha fé....mas num mundo melhor, baseado na Justiça e na concórdia. Com o jovem sangue nas guelras, Amatullah empenhava-se fortemente nas causas que lhe mereciam atenção. Ainda há uns tempos havia estado, juntamente com o seu amigo Yussuf, em várias manifestações da Revolução dos Cedros, na sequência do assassinato do primeiro ministro Rafik Hariri. O Yussuf é um rapaz, algo mais velho que Amatullah (tem 29 anos) mas responsável e educado. Amatullah conheceu-o quando entrara para a Faculdade, era ele finalista de Estudos da Francofonia. Uma vez que não conseguiu encontrar trabalho, teve que se empregar numa empresa de transitário no Porto de Beirute, trabalhando na escrituração de carga dos navios para Atenas e Larnaca. Não lhe rendia muito mas dava para pagar a renda do pequeno apartamento que alugou no sul de Beirute, zona que, em resultado da criminalidade e até da existência de guetos de extremistas políticos, era bastante mais barata. O apartamento fica não muito longe da zona de Jisr El Bacha onde, naquela tarde de há 10 dias atrás, Amatullah se encontrou com Yussuf para juntos irem ver o novo espaço que ele alugou. Apareceram mais amigos, fez-se uma jantarada... mas a noite de Beirute já ia longa e Amatullah teve que regressar a casa, sozinha por entre os silêncios daquela rua subitamente abalados pelo estrondo ensurdecedor da morte...
Assim termina uma "estória" que, claro está, é absolutamente falsa. Mas o Estado de Israel é já responsável, só no Líbano, pelo terminus de 300 outras "estórias" verdadeiras em tudo semelhantes a esta.
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segunda-feira, julho 17, 2006


VERDADE EM ESTADO PURO

Sim, pode parecer um lugar comum, uma balela, filosofia barata, um clichet, mas juro e atiro água benta (lol) em como é verdade:

Watch your thoughts; they become your words.
Watch your words; they become your actions.
Watch your actions; they become your habits.
Watch your habits; they become your character.
Watch your character for it will become your destiny.

terça-feira, julho 11, 2006

TALHÃO NÚMERO SEIS, COVA NÝUMERO SESSENTA E QUATRO (UM ANO DEPOIS)

Onde estás?Passo o Pórtico Verde e procuro por ti…Onde estás?Houve um sorriso com que uma vez me encaraste que, tudo me dizendo e trespassando-me com cruel frivolidade, me embalou no teu regaço…Queres ir hoje ao cinema? Vamos ver aquele filme..Vem daí!Passo o pórtico Verde, viro á direita…tantas flores….Onde estás?Prometeste caminhar ao meu lado. Para sempre… Fotos nunca existiram porque éramos eternos. Tu, eu, nós, o mundo…Tuas palavras seriam terna e eternamente abençoadas por Cronos, porquanto nem ante o Tempo soçobraríamos. E companheiros seríamos em velhos.Queres ir hoje à Praia? Anda!! Vamos à barrinha!Passo o pórtico verde, viro á direita, tantas flores!, viro à esquerda…uma senhora idosa, de preto, olha para mim…Onde estás?E passeámos em matos verdes de Vida sem que a Morte nos tangesse porque éramos jovens e eu, que em ti vivia, confiava que em mim nunca morrerias. E o vento que gentilmente nossas almas amainava, não nos trazia novas da Eternidade. Lá longe jaziam, calmas, as nossas esperanças.‘Bora jantar fora! Hoje! Ao Gargalo, claro!! Aquela pizza…Passo o pórtico verde, viro à direita, tantas flores!, viro à esquerda…uma senhora idosa, de preto, olha para mim…caminho…tanto mármore! Ele, crucificado, está em todo o lado olhando para mim com evidente rosto de soror…mas onde estás?Apartados nunca estivemos até que teu coração, apertando o meu, apertou-se em ti. E fugiste-me por entre os dedos como a areia daquela Praia…onde a luz tépida de Outono, pronunciando o ocaso, nos concedia a extrema-unção.Anda…vamos passear? Que tens? Tens medo? Do quê?Passo o pórtico verde, viro à direita, tantas flores!, viro à esquerda…uma senhora idosa, de preto, olha para mim…caminho…tanto mármore! Ele, crucificado, está em todo o lado olhando para mim com evidente rosto de soror. Tanto branco, tanta pedra…Encontrei-te!! Ah ...estavas aqui!!! Talhão número 6, Cova número 64…
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PS: publicação simultânea no blog Devaneios Desintéricos

domingo, julho 09, 2006


PEDRAS NO CAMINHO?

"Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo. E que posso evitar que ela vá à falência. Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise. Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e tornar-se um autor da própria história. É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da alma. É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida. Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um "não". É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta. Pedras no caminho? GUARDO TODAS. UM DIA, VOU CONSTRUIR UM CASTELO..."
Fernando Pessoa

sábado, julho 01, 2006

O ESPAÇO QUE NOS APARTA

Aqui, neste espaço entre mim e ti, nada mais existe para além do vazio. Um calmo e pleno nada, outrora um tudo, completo de sonhos e fantasias de perfeita eternidade, onde a efemeridade era para nós, para mim e para ti, apenas (e só) uma etapa da nossa felicidade.

Por mim, e por ti, escondi-me atrás de portas abertas, com ambições repletas, que comigo percorresses a terrena essência dos dias e no meu regaço desfalecesse o acre temor dos teus olhos cheios de realidade.

Acreditei, como verdade pura (ah dogma de uma idílica e planeada existência!!!) que a eternidade, a mim e a ti, nos tocava e que tu, ao contrário de mim e dos outros, transportavas a plenitude do Tempo que em cada abraço me confirmavas…

Depois de ti e já sem ti conheci a amarga substância do findar dos sonhos separados de mim pelo mesmo espaço que nos aparta: metro e meio de terra.