sexta-feira, março 06, 2009

NOVOS PARADIGMAS (POR VIA DOS EXCESSOS)

Não sou apologista de fundamentalismos e, indenpendentemente dos benefícios (inegáveis, como a publicação desta opinião ou, em versão digital com poupança de árvores, post) do info and net (work) world, o certo é que este tem conduzido a novos modelos de estar e de interagir, nem sempre objectiva ou subjectivamente lineares (eufemismo para vantajosos).

Pessoalmente, deixei de ter ligação constante à Internet (i.e., na residência habitual) no final de 2006, apesar dos actuais preços irrisórios. Em 1997, cheguei a fazer com que a minha mãe pagasse 30 contos pela nova ligação. Fala-se muito nas toxicodependências. E outras dependências? O jogo, o sexo, a Internet... Sobre esta última, gostaria de ter feito ou de vir a fazer um trabalho de investigação. Pela constatação dos impactos explícitos e implícitos nos outros e porque há uns anos, quando chegava a casa, a primeira coisa que fazia era ligar o computador. O mesmo ao acordar, desleixando-me na alimentação, no sono, nos passeios, na cultura, nas amizades. Sim, nas amizades, porque a ideia de que a Internet aproxima é relativamente aparente (o que daria para uma discussão em dezenas de páginas de um trabalho de investigação): as recordações que tenho nasceram in real e não in vitro (leia-se virtual). Ou seja, não será o tempo despendido na Net (alusão à simplificação) tempo perdido para ganharmos lembranças? Volumes, espaços e lembranças com corpo: aparições, presenças e recordações. Porque estas vivem essencialmente de cheiros, olhares, gestos, luzes, sombras, fluxos que nos aparam, envolvem no vazio... De um todo. E não tanto de pontas de dedos e um ecrã, solitários. E, afinal, a felicidade tem que ser baseada na verdade e no real. A alegria é outra coisa.

No último dia 26 de Fevereiro, foi publicado no Diário de Notícias um artigo que resume muito do que penso há uns anos sobre o assunto, nomeadamente sobre a influência da Net nos processos mentais (que englobam, claro, os racionais, os emocionais...), com as devidas consequências. Extractos:

- 'O Facebook e o Twitter estão a mudar a forma como pensamos (...) literalmente';

- Susan Greenfield, uma prestigiada neurologista, defende que 'os efeitos culturais e psicológicos das relações online vão mudar o cérebro das próximas gerações: menos capacidade de concentração, mais egoísmo, dificuldade de simpatizar com os outros e uma identidade mais frágil';

- 'Portugal é o terceiro país Europeu que mais utiliza as redes sociais na Internet';

- 'a exposição das crianças à rapidez da comunicação pode acostumar o cérebro a trabalhar em escalas de tempo muito curtas e aumentar os distúrbios de défices de atenção';

- 'preferência pelas recompensas imediatas, ligada às áreas do cérebro que também estão envolvidas na dependência de drogas (...) vai-se mais atrás do prazer rápido';

- 'Nas crianças, aquilo que é óbvio é que as novas formas de comunicação, menos presenciais, criam um modelo de interacção menos humanizado, muito menos rico a nível emocional, já que a capacidade de sentir o outro é limidada, ou seja, a capacidade de desenvolver empatia também pode ser afectada';

- 'Há pessoas que privilegiam a conversa atrás do teclado, onde podem ficar escondidas. Por isso, apesar de aparentemente facilitar a comunicação, acaba por simplificá-la demais'.

8 comentários:

MA-S disse...

Já a minha mãe corrobora todos os parágrafos, todas as palavras e pontos finais deste post!
É verdade sim senhor...a net é uma "droga".

Dartacão disse...

E corrobora todos as reticências também? eheh

Já apanhaste alguma overdose?

Anónimo disse...

Não posso concordar mais com o sentido do teu texto. Como tudo, a net convoca-nos, nos tempos hodiernos, senão somos "info-excluídos", mas efectivamente aporta mais exclusão que inclusão, na voragem ilusória, falaciosa, do que é virtual. Por detrás de cada gesto é certo que há pessoas, todavia pessoas "simplificadas", num discurso redutor que raramente aproxima fazendo crer às pessoas que mais se ligam. Ahh que ligação perigosa, quando os "amigos" ou mal se conhecem, ou estão na mesma terra e trocam o calor humano presencial por uma teclagem confortável (fora o desconforto de estar mt tempo sentado a dedilhar e dar cabo dos olhos que crêem ver...)mas solitária, de certo modo egoística! Diria ainda que, tal como se dizia que noutro tempo o "ditador" do Stª Comba Dão gostava de manter o analfabetismo (relativa injustiça esta ideia), ao politicamente correcto de agora interessa (e disso vive) a desunião "real" das pessoas, a desagregação vivencial e de causas trocada por uma pretensa maioridade tecnológica e informativa. Nunca se esteve tão só. E a falsidade (ou incompletude) da democracia (e do desenvolvimento) deste mundo tem muito a ver, entre outras razões, com o fenómeno da virtualidade, descaracterizador de autenticidades, demolidor de caminhos de partilha, redutor de complexidades e nuances que fazem toda a diferença. Mas, como em tudo, ponto é sabear dosear e saber prioritizar. Assim o possamos fazer com a coerência de agir em conformidade, pois é isso que estas reflexões exigem posto que tanto o autor do texto, como este comentador, usam um blog e estão a comunicar por via da grande rede do nosso tempo...ou seja, pois que, para nosso bem, não fiquemos por aqui e o que vale é que nos conhecemos em parte daqui mas não, nunca, essencialmente por aqui. Dixit.

Pedro Fitch disse...

Neste ponto, como na vida em geral, é preciso encontrar um ponto de equilíbrio, não deixando que umas coisas substituam as outras. A minha experiência pessoal diz-me, também, que isso nem sempre é fácil e cair nas manhas sedutoras da internet é algo que a muitos acontece. Mas, de facto, quando o meu portátil esteve a mudar o lcd, reconheço que nesses dias li mais, vi mais televisão, descansei mais. Aproveitei para ler aí um "aviso à navegação".

MA-S disse...

Overdose???
Epá...ainda não...
Tenho níveis de tolerância muito elevados...ou então uma taxa "NETabólica" muito acelerada para estas coisas...
Mas não fico com síndrome de abstinência quando me é impossível tê-la sempre por perto...in fact...até vou para a cama mais cedo, até mesmo antes dos patinhos darem...LOL

Dartacão disse...

Anónimo (não para mim m:)),

Excelente abordagem do tema, com aquela profundidade que sabes incutir nas tuas reflexões, elevando o nível de discussão, patente aqui no virtual, mas, felizmente, muito mais patente no real, onde a alma ganha corpo.

Bem gostaria de desenvolver mais o meu comentário, mas sabes que prefiro a poesia à prosa, além de que disseste praticamente tudo, mas nada que não tenhamos já partilhado 'in real' e muito pouco 'in vitro'.

Um aparte: na verdade, parece-me que a festa do convívio dos corpos virtualiza a alma da necessidade de sermos competitivos no mundo da produção e de sermos melhores que os vizinhos. 'Iludências que aparudem' na gestão das prioridades... Mas ainda que as prioridades pareçam pouco prementes, a essência não tem que ser redundante nem repetitiva na sua demonstração...

Obrigado pela partilha, por elevares a dinâmica dos poucos apontamentos virtuais que aqui deixo das muitas deambulações reais.

Dartacão disse...

Fitch,

Sim, equilíbrio, equilíbrio, equilíbrio... :)

Sim, a net também tem os seus pontos positivos! (Prova disso, a existência deste blogue, ainda que seja uma amostra de outro Universo, mais completo, mais diverso, real... Afinal, a riqueza nasce muito da diversidade).

Dartacão disse...

MA-S,

Não estás viciada, portanto... LOL

Bem, os viciados não costumam reconhecer o vício... Costumam?